Em prédios compostos de unidades autônomas residenciais e comerciais, com
lojas situadas no pavimento térreo independentes dos demais compartimentos do
prédio, com entrada autônoma e exclusiva, com acesso direto para a via pública,
devem participar do rateio das despesas de manutenção, conservação, limpeza e
reparos, bem como do pagamento de impostos e quota de seguro obrigatório?
VIVA O CONDOMÍNIO
Publicado em: 28 de julho de 2021
A circunstância das lojas que
tenham entradas autônomas, não as fazem unidades apartadas do edifício, na
medida em que o acesso a logradouro público é apenas uma das partes comuns a
todos pertencentes, na forma do § 2° do art. 1331 do Código Civil, segundo
o qual “o solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição
de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração centrais, e as
demais partes comuns, [inclusive o acesso ao logradouro público,] são
utilizados em comum pelos condôminos, não podendo ser alienados separadamente,
ou divididos.”
As lojas estão alicerçadas em terreno
único que está em comunhão de todos os proprietários, consoante externa o
Código Civil brasileiro, no § 3° do art. 1.331, segundo o qual: “A cada
unidade imobiliária caberá, como parte inseparável, uma fração ideal no solo e
nas outras partes comuns […]”, o mesmo ocorrendo com as fundações,
paredes externas, o teto, as áreas internas de ventilação, que, sem autorização
dos demais coproprietários, não podem sofrer alteração de modo a comprometer a
segurança e o conforto, nem subverter a conformação inicial.
Portanto, as lojas situadas no
pavimento térreo, ainda que tenham acesso independente à via pública, fazem
parte do condomínio (inclusive tendo também direito a presença ou voto em
assembleia de qualquer natureza), razão pela qual se submetem ao pagamento do
seguro obrigatório do prédio, bem como pelas obras de reforma da fachada do
edifício, de conservação e manutenção do passeio, do telhado, da marquise, dos
sistemas de água e esgoto que estejam estritamente ligados entre todas as
unidades, dentre outros, conforme previsão expressa no Código Civil, art. 1.336
do CC, segundo o qual “(…) contribuir para as despesas do condomínio na
proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção.”
(1)
(1) Correspondente na Lei 4.591/64, art. 12, § 1°
A taxa condominial decorre de
previsão legal e também da relação fática existente entre os coproprietários,
não sendo razoável impor aos donos de lojas a participação integral no rateio
na proporção de suas frações ideais, tampouco excluí-las totalmente do rateio,
conforme estabelecem algumas convenções de condomínios.
Especificamente quanto à participação
das lojas no rateio do seguro contra incêndio ou outro sinistro envolvendo o
edifício, se faz necessária porque eventuais incêndios ou sinistros nas lojas
(ou vice-versa) podem afetar o edifício como um todo.
Dispõe o “caput” do artigo 13 da Lei
4.591/64, que trata sobre condomínio e incorporação, que: “Proceder-se-á ao
seguro da edificação ou do conjunto de edificações, neste caso,
discriminadamente, abrangendo todas as unidades autônomas e partes comuns,
contra incêndio ou outro sinistro que cause destruição no todo ou em parte,
computando-se o prêmio nas despesas ordinárias do condomínio. ”
Sendo assim, é razoável que o condomínio
delimite de forma especifica quais são as despesas comuns a todos
os condôminos, bem como fixem o percentual a que se sujeitarão as lojas
térreas, relativas às despesas comuns que as beneficiarem (devem
participar do rateio do seguro obrigatório do prédio, pelas obras de reforma da
fachada do edifício, de conservação e manutenção do passeio, do telhado, da
marquise, dos sistemas de água e esgoto que estejam estritamente ligados entre
todas as unidades, dentre outros), não havendo como restringir a
contribuição das lojas nestas despesas comuns a todos e que valorizam o
prédio como um todo.
Em relação àquelas despesas
decorrentes do uso exclusivo de eventual área comum coberta ou
descoberta que sirvam ao acesso exclusivo das lojas (manutenção e
conservação das calçadas, escadarias e acesso para deficientes físicos), que
estejam localizadas em frente e/ou ao redor das lojas, o Código Civil dispõe no
artigo 1.340 (2) que, “se certas partes do condomínio, embora de
natureza comum, servem ao uso exclusivo de um ou alguns condôminos, as despesas
de manutenção e conservação do espaço incumbem a quem delas se serve”.
(2) Art. 1340. As despesas relativas a partes comuns de uso exclusivo de um
condômino, ou de alguns deles, incumbem a quem delas se serve.
A partir da vigência do CCB (2003), a posse exclusiva de área comum ou benfeitorias úteis de utilidade exclusiva, justifica e legitima a cobrança das verbas condominiais proporcionais exclusivamente de quem as utilizadas. Referido dispositivo visa evitar o enriquecimento sem causa, positivado como cláusula geral no artigo 884 do Código Civil (3), do condômino ou grupo de condôminos em proveito dos quais reverte o proveito exclusivo de certas despesas.
Consigna-se que há entendimento
jurisprudencial, no sentido de se atribuir interpretação mais ampla ao artigo
1.340 do CCB, incluindo-se, não apenas a situação do uso exclusivo, mas também
a fruição habitual, podendo ser cobrada aquelas despesas de custeio que as
beneficiam de alguma forma, das quais devem participar.
De acordo com o entendimento do
STJ, “a convenção condominial deve estar em sintonia com a Lei porque
apesar da autonomia dos condôminos em autorregulamentar suas condutas, jamais
poderão perder de vista a Lei, cuja obediência se impõe pelo princípio da
supremacia da ordem pública sobre as deliberações privadas. A regra
estabelecida no art. 1.340 do novo Código Civil atende ao princípio da
equidade, evitando o enriquecimento indevido dos condôminos que se utilizam de
serviços ou de partes comuns a diversos deles, em detrimento daqueles que não
utilizam os referidos serviços e equipamentos comuns.” (STJ; REsp
1.704.578; Proc. 2015/0259888-9; PR; Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino;
Julg. 09/03/2018; DJE 14/03/2018; Pág. 4391).
A norma disposta no artigo 1.340 do
CCB é cogente, de modo que prevalece sobre disposição convencional, ou decisão
de assembleia de condôminos. Constitui exceção à regra geral do rateio de
despesas prevista no art. 1.336, inciso I, do CCB.
Conforme entendimento da
jurisprudência do STJ, “A considerar a existência de disposição
convencional, de modo a estabelecer o critério pela qual as despesas condominiais
devem ser partilhadas, sua observância, por determinação legal, seria de
rigor. Apesar disso, é de se destacar que, em princípio, nem tudo o que
a convenção do condomínio estabelecer poderá fazer lei entre os condôminos,
mormente se ela ferir o ordenamento jurídico e a lógica.” (STJ;
AgInt-EDcl-EDcl-AREsp 1.352.120; Proc. 2018/0217819-5; DF; 3ª. T.; Rel. Min.
Moura Ribeiro; Julg. 01/06/2020; DJE 04/06/2020).
Em conclusão, as convenções não devem
isentar totalmente as lojas do pagamento das despesas, devendo delimitar de
forma especifica quais são as despesas comuns a todos os
condôminos e quais destas seriam devidas pelos
lojistas, estabelecendo a forma e critério de rateio, acrescentando
critério de rateio das despesas das áreas comuns, que pela situação
fática são de uso exclusivo das lojas.
Eventual necessidade de alteração da
convenção quanto a esse tema, deverá ser realizada em Assembleia Geral
Extraordinária e aprovada pelos proprietários de 2/3 das frações ideais do
terreno conforme previsão no art. 1.351 do CCB (4) , cujo assunto deverá
constar na ordem do edital e deverão ser convocados todos os proprietários,
observando-se todas as regras de convocação previstas na convenção, bem como a
legislação que trata a matéria (art. 1.354, CCB e art. 24 da Lei 4.591/64).
Uma vez aprovada a alteração da
convenção de condomínio, a Ata da Assembleia Extraordinária deverá ser
registrada perante o competente Registro de Imóveis, onde encontra-se
registrada a respectiva convenção.
(3) Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se
enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente
auferido, feita a atualização dos valores monetários.
(4)Depende da aprovação de
2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos a alteração da convenção; a mudança
da destinação do edifício, ou da unidade imobiliária, depende da aprovação pela
unanimidade dos condôminos. (NR) (Artigo com redação determinada na Lei nº
10.931, de 2.8.2004, DOU 3.8.2004)